Nessa busca de por onde começar a escrever sobre tantas coisas que não têm cara de palavras, comecei a perceber com olhos argutos de águia o teor deste mês que passou. Muito escrevi nesse Abril (despedaçado.fragmentado.inacabado) que me parece ter passado um ano inteiro, meses e meses de vida acumulada em potes de geléia. Nem lembrava mais datas, tive que buscá-las na tabelinha, tão longínquo me parecia certo acontecimento! E o outro que o precedeu então, podia muito bem ter ocorrido em outra vida que não esta minha, nem lembrava mesmo, a fatura só vem em maio, afinal, o que me faz recordar do número 3, tão insignificante parece agora.
Acho que vivi muito intensamente em Abril, e cada dia se desdobrou em infinito tempo que não consigo contar. Abri muitas portas em abril, e também entre muitos gritos as fingi fechar. Deve ser por isso que ainda acreditava estar no meio do mês!
Fui muito ridícula em Abril, se fui, mas sinceramente acho que me dando essa liberdade do não-pensar consegui alcançar outros patamares na longa escadaria que nos leva ao prazer, tocando levemente a brisa vinda do mar. Desci, subi, cantei, escrevi: não há o que deixei de fazer em Abril - vivi.
Claro que nessa ânsia de não evitar nada, sofri, mas esse também foi mais um dos sentimentos embalados pelo Abril abundante e túrgido. Hoje, vejo que não se destacou dos outros, apenas integrou-se totalmente nesta festa de que lhes falo agora. E o dia do aniversário é só amanhã. Muito fui atormentada pelos conflitos, mas também hoje, com olhos bem abertos, vejo que eu que os criei - assim, displicentemente, deliberadamente.
Tudo saiu mesmo da minha mente.
Achei engraçado refletir, nesse fim de mês, sobre meu caldeirão de bruxa, mais fervente e borbulhante que nunca hahaha. É o que eu gosto afinal, não? Não há como esconder que eu que coloco os ingredientes certos para causar toda essa ebulição incontrolável, toda essa mistura volátil de forças opostas. Sim, sim, mea culpa. O dia que essa mistura ficar pronta e sair da panela não vai sobrar pedra sobre pedra. E eu, claro, vou estar no olho do furacão.
Quer saber, que se dane.

Entretanto, nada disso espanta a força daqueles versos...

Como ao baralho o jogador
Como à carniça o parasita
Como à garrafa o bebedor
Maldito sejas, maldito!

Nada pode ser dito além desses versos tão sinceros.


O que eu não daria para meus olhos não precisarem mais perseguir seus passos sempre passando por mim. O que eu não daria para não ouvir sua voz falando a outros ouvidos que não o meu. Poderia também esquecer sua pele, seus movimentos ritmados que se repetem involuntariamente no lugar onde reside minha memória. A sensação de minha boca sugar cada perfume seu como algo vital, as tulipas brotando ao meu redor, borbulhando néctar em seus cálices de calor pungente. Ainda lembro de suas mãos banhadas por esse mel opiáceo quando brincávamos em nosso jardim edílico. Tudo isso, quisera eu ser apenas uma nuvem de fumaça que se dissipa, o orvalho da manhã que se vai com o sol. O que eu não faria para voltar àquele dia, nosso baile à fantasia particular: você - palhaço, eu - colombina. Queria o ver novamente com o nariz vermelho de plástico. Engraçado: onde foi que o deixou? Procuro incansavelmente por essa resposta, mais que a todas as outras que nunca me deu. Lembro apenas que era o palhaço mais bonito, a fantasia mais perfeita. Maquiagem daqueles tempos efêmeros ainda escorre pela minha face. Onde está seu nariz? Penso agora que talvez fizesse diferente, mas sei que tudo igual. Quero apenas roubar seus gestos para mim, apropriar-me da sua essência que nunca vi. O que eu não daria para o conhecer, para olhar dentro de você como se fosse a primeira vez. Ainda que fosse a última.
Tivemos azar, acho. Combina com você isso, combina tanto com você, comigo, conosco. É a dor incalculada desse azar que mais me maltrata (mais que suas mãos morbidamente frias). Ele me tira totalmente o controle, lânguido, olhos e auréolas violeta de quem jamais dorme. Ainda está me vigiando, e por isso que faço tantas coisas que, sem querer, apunhalam a mim mesma (não ouso falar de você, desconheço-o). O que não daria para ter você como nunca tive, como sempre quis, despido de tudo que nos separa. Queria suas respostas acumuladas às minhas perguntas sem sentido.
Tudo o que faço é para você, mesmo se eu fingir não ser. Meu prazer me mata, o seu prazer me mata: por isso que sempre fecho os olhos. O que eu não daria para que usasse mais uma vez o nariz.
Aquele, vermelho.


Patchwork

Nada me coloca mais contra a parede que o êxito e sua inigualável sensação de sucesso, sempre tão opressora. Não sou e nem quero me acostumar com a calmaria da felicidade, o conforto do seguro, o sol nascente em raios alaranjados. Um dia fui feliz assim, com o calor e a vivacidade, mas hoje me sinto tão diferente, despreparada para tais sentimentos. Fico então resgatando a melancolia dos pequenos momentos, as verdades que estão entrelaçadas nessa falsa placidez que quase me convence. Perco-me com facilidade na claridade, pois há tanto tempo ando no escuro.
Estou afundando nessa areia movediça sem nada a que me segurar, e as vozes que sussurravam ao meu ouvido nada mais são que longínquos murmúrios de nada.
Agora também acabei de perceber o quanto eu demoro para deglutir os dias que se passam, e é por isso que tudo o que eu estou escrevendo agora mais me parece um vômito forçado a uma reflexão. Estou precisando dizer algo, mas não faço idéia do que dizer ainda. Certeza que daqui umas duas semanas tudo ficará claro (ou não) na minha mente oca. É o que espero afinal.
O fato é que nada que eu faça consegue vencer os pensamentos naquele que suavemente me domina. Finjo me afastar, mas quando olho um segundo ao redor vejo o quanto estou mais atada a esses pensamentos que sugam minha fria existência.
Não sei mais o que fazer para tentar sair desse pântano de lembranças, fugindo para cada vez mais perto desses tentáculos dos quais não consigo me desvencilhar. Já perdoei, mas talvez nunca consiga superar.
Talvez realmente existam coisas que sempre me perseguirão, não importa onde eu vá.
Não importa o quão alto eu grite.
Nem importa que eu me afogue nessas lágrimas que não consigo esquecer.


O que foi aquela fração de olhar que tirou o balanço do meu dia? Mal poderia dizer a cor dos seus olhos se não os conhecesse bem, infímo foi o segundo que nos encontramos. Depois disso, a distância e frio costumazes, ao qual não me acostumo nem no reino do pensar.
Será que posso me conter por toda a eternidade enquanto ela dure? Sinto o meu espírito falhar a cada encontro, uma falta de tudo e sobra de nada, a loucura repetida que grita 'encore'.
Tão triste é a tortura que me une a essas sensações sublimes que quase não posso agüentar mais um dia para sofrer com mais detalhes banhados de efervescência transitória.

Quanto ar é preciso para me sufocar?


A cada número que muda no visor do relógio, algo estremece dentro de mim, o amargo da ansiedade me sobe à boca, as lágrimas acotovelam-se nos cantos dos olhos. Mil coisas passam por dentro da minha mente, mil explicações para cada chamada não atendida, mil tormentos de felicidade e pavor. Penso nos versos inacabados, nos contos não terminados, nos desenhos à lápis, em todas as coisas - e são tantas - que vão se acumulando na seção de "não finalizados" da minha vida. Não queria mais uma. Não preciso de mais uma.
Tantas são as incertezas do meu sobreviver que não sei mais para onde olhar, aonde ir... talvez a imobilidade e a prostração perante o amanhã sejam o destino pelo qual devo esperar, pelo qual não preciso lutar.
Tento continuar, mas não consigo, tamanho é o poder do jugo que me foi imposto.

Quanto ar é preciso para me sufocar?


Alguns minutinhos singelos de ócio já me jogam neste turbilhão de pensamentos e reflexões sobre tudo o que eu quero esquecer. Luto contra os desejos anarquistas da minha mente, mas eles sempre me vencem, largo tudo, esqueço tudo e me volto apenas para aquela visão iridescente que turva meus pensamentos. As minhas amarras parecem não me machucar mais, as vendas estão confortavelmente postas sobre meus olhos. É quase um transe: vêm as ondas do mar me tragando para o fundo de um devaneio, atlântida é a cidade dos sonhos profundos e confusos que me envolvem com o frio mortal de águas tão longínquas. Cada vez mais vou perdendo minha consciência, penetrando na luz e na escuridão que sempre me apontam o mesmo caminho, aquele que me leva inevitavelmente até você.
Sofro com seu olhar distante ou com as palavras que não nos dissemos. São espinhos que agora estão rasgando minha garganta até segunda ordem. Minha pele está ficando azulada, meus olhos embaçados - tomo a aparência dos mortos para me aproximar de você nessa cidade de tumbas que é a memória. Mesmo sem vida entre nós ainda desejo ardentemente seus abraços.


Estou aqui enrolando há uma hora para escrever esse post, mesmo sabendo que isso será um problema mais tarde. Enfim, depois dessa maravilhosa semana - e acreditem, foi boa mesmo - me encontro novamente olhando para o horizonte, diversos caminhos a minha frente e, ao mesmo tempo, nenhum.
Por onde seguir?
Sinto-me perdida no meio de tantas coisas boas que acontecem na minha vida. Parece estranho, mas essa maré de "coisas dando certo" está me sufocando um pouco. Tenho vontade de largar tudo, começar do zero, mas motivos práticos me impedem de fazer isso.
Sendo sincera comigo mesma, estou com o coração partido em dois e as mãos atadas. E esse sofrimento interminável que me mata. E essa indiferença. E essa dúvida toda.
O que farei? Estou certa das minhas intenções futuras, mas suas conseqüências...
Só preciso de um pouco de verdade no meio de toda essa farsa. Por que é tão difícil? Por que mentir para mim?


Confesso que sinto uma dificuldade sensível em viver sem a sua monótona presença. Parece incoerente, admito, mas aquele incômodo que ele causava diariamente em mim faz falta. É a saudade do jogo de olhares, das frases displicentemente trocadas, os pensamentos formando uma nuvem invisível que aconchegava o meu ser. Agora reside a impotência, as cartas foram tiradas quase que em definitivo das minhas mãos: não consigo agir sem ter a sensação do convívio, sem que possa perceber nos hiatos que se formavam entre nós o que estava acontecendo realmente. Sinto-me um tanto ridícula por ter ficado tão dependente do seu cheiro, mesmo que distante, perdido entre tantos outros aromas de plástico. É a rotina do bom dia, das piadas inacabadas, o gosto do secreto em minha boca - a tudo isso me vejo presa, amordaçada e atada às suas lembranças difusas.
Sinceramente nem devia pensar muito nisso. Às vezes, parecem tão sutis essas memórias que nos unem que, se eu pensar muito sobre elas, podem ficar cada vez mais gastas até que um dia desapareçam por completo. Seria bom. Ao mesmo tempo não quero perder essas estrelas que brilham à distância, quero que elas caiam sobre mim como cometas, envolvam-me no seu calor, no fogo que incendeia minha alma. Que me destruam, que explodam minha mente em mil pedaços! Apenas não posso cogitar a possibilidade de me esquecer do doce timbre da sua voz.
Estou no pico da falta total de concentração e quando tento apurar a causa, quem me vem à mente é sempre a mesma pessoa demoníaca. A fallen angel.
Foi por isso que eu procurei, não? Foi isso o que eu encontrei. Foi isso o que não tive. Foi isso o que perdi.


Ainda, em vão, me pego tentando entender o que aconteceu nos últimos dias, como viajei distâncias tão grandes em minúsculo tempo. Releio os meus pensamentos, redijo linhas de memórias que possam me indicar onde foi que tudo mudou para continuar igual. Há alguns minutos algo me disse que essa situação foi toda premeditada por mim mesma, com o objetivo de chegar triunfalmente a esse final bastante desgraçado. Não me veio em mente o porquê, mas o processo faz até bastante sentido, em se tratando de mim. Gostaria de reviver alguns minutos, de fazer diferente, de sobrescrever minhas falas, mas é impossível, claro. Ainda assim gostaria, mesmo sabendo que faria exatamente tudo igual, teimosa.
Um dia achei, em uma inocência há muito esquecida, que agora estava confiante dos meus passos e decisões, mas sei que isso se reflete apenas em parte de minha vida - a parte que, sinceramente, pouco me importa. Não consigo superar esse medo de perder o que tenho, não consigo, não consigo por mais que tente, por mais que me convença que posso recuperar tudo de novo. Foi tanto que perdi. E aprendi que nada pode ser retomado no seu estado natural, puro - as coisas podem até voltar, mas sempre corrompidas pela dor, mágoas, tempo, silêncio.
Silêncio. Ainda ouço seu farfalhar entre nós, os lamentos dos minutos engolidos pela ampulheta.
Estou triste com esse desfecho malfadado, pelos gastos sem sentido; acho que mais pelo que ele me faz recobrar que pelo fato em si. Novamente percebo em mim as marcas que nunca serão esquecidas, os hematomas brotando sob a pele, o sangue, a dor, loucura gritando mais uma vez em meus ouvidos. É como a ponta de um novelo, uma lembrança que vai me puxando para trás sem meu consentimento, seguindo os caminhos negros de outrora. Perco-me nas florestas sussurrando as conversas que deveriam ser mudas, as figuras tortas turvando-me a visão, tomando meu ser com todo o pavor que costura minha boca para que eu não grite.
These wounds don't seem to heal
Preciso fugir dessas memórias que parecem me tragar para dentro de suas bocas negras como a morte. Quanto mais corro, entretanto, mais estou perdida nesse cemitério de esqueletos.


Nem sei se devo pensar sobre isso agora, talvez meditar sobre a questão fosse prudente. Não quero, contudo. De pensar passou-se o tempo, de pensar perdi o fogo que ardia na minha irresponsabilidade. Não paro de me culpar por tamanha impotência, covardia, dúvidas perante o amanhecer. Recomeço do zero agora, perdida, sem direção, pronta para cometer tantos novos erros que me levarão novamente para esse mesmo lugar. Juro que lutei, tentei, saboreei cada gota de ar com vontade de viver, mas morri. Algo assim, inevitável. Nada mais que covardia, acho.
É quente esse lugar que estou, confortável e ameno como sempre nunca desejei. Quero gritar, incendiar-me para sempre, acordar renovada. Quero ódio, paixão, sangue, ossos latejando com as pancadas displicentes do destino.
Vejo-me rodeada por ratos.

Só quero você.

Just one look into your eyes
One look and I'm crying
Cause you're so beautiful
Just one kiss and I'm alive
One kiss and I'm ready to die
Cause you're so beautiful
Just one touch and I'm on fire
One touch and I'm crying
Cause you're so beautiful
Just one smile and I'm wild
One smile and I'm ready to die
Cause you're so beautiful
Oh you're so beautiful
My darling
Oh you're so beautiful
You're so beautiful
Oh my babe
You're so beautiful
Oh you're so beautiful
Oh my darling, oh my babe
You're so beautiful

Beautiful - HIM

PS: preguei 1º de abril em mim mesma...

O que aprendi hoje: Não se ouve música em ordem alfabética.


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