...e então aparece a deixa, a oportunidade perfeita de realizar algo que venho adiando faz anos.

Só que não consigo agarrar. As dúvidas preenchem meus pensamentos e também o medo de estrangular minhas emoções mais sinceras. O prazer contra a necessidade. O amor contra a obrigação. As certezas contra as decepções.

E principalmente o presente contra o futuro.

Fico adiando as decisões na esperança de um milagre. Quando vou aceitar que não existem? Quando vou deixar de sonhar?

Quando?



Podemos nos enganar e fingir que não, mas é apenas um grande descontrole.
Não é um, como eu ou você, mas vários, a toda hora, sem parar. Basta apenas algumas horas... e sem prestar muita atenção. Penso quantos dias já foram e nem vi.
Nunca chega, sempre é mais, é assim que funciona. Não um, mas todos os tipos disponíveis, tudo ao mesmo tempo.
Se o começo é no convívio, depois é na solidão. E quanto mais a solidão, mais o descontrole.
Não tem meio, ou pausas, ou razão.
Há o começo.
Não tem fim.


Tanta coisa passa na minha cabeça agora que é até difícil organizar os pensamentos. Nos últimos dias aconteceram alguns eventos que me levaram a pensar onde e como eu estava nesse mesmo momento o ano passado...

Percebi que nada mudou.

Quer dizer, muita coisa rodou, mudou, se transformou, mas no final mesmo tudo voltou às suas posições iniciais.

O que parecia curado, sangra. Me pergunto como pude me enganar, depois lembro como é boa a sensação de ilusão. A sensação de que as coisas imutáveis podem sim mudar. Que os problemas insolúveis quem sabe podem se resolver.

Tudo besteira.

E nessa, assim como em várias outras situações da minha vida, vejo que caráter não se muda. Uma ver deturpado, uma vez apodrecido e ruim... assim será para sempre.

Com os primeiros sinais, as primeiras mentiras, ainda há aquela tentativa boba de desviar o olhar: "ah, mente porque se envergonha". Pouco tempo para viver nessa ilusão. Pouco tempo para ver que a vergonha de fato não existe, pouco tempo para ver que a luta é mais uma vez perdida.

Aí vem a hipocrisia. Vem o cinismo. E a obrigação de conviver com tudo aquilo que desprezo com todas as minhas forças. A farsa, os olhares trocados em silêncio, a dor partilhada.
Pequenos gestos são notados, a audição fica aguçada, procurando o próximo sinal de piora, o próximo passo para um caminho que além de não ter volta, apenas se torna mais triste e infeliz.

Ainda assim o que mais me incomoda é a violência das atitudes. Violência que não se pode combater, que não há denúncia possível, que sequer se pode comentar. A violência de esfregar na cara de todos o quanto somos inúteis, fracos, insignificantes, marcados e - principalmente - impotentes.

Creio que certas coisas não podem ser contadas, ou traduzidas, ou divididas com alguém que não as vive. Não é uma questão de se endurecer, ou se proteger, mas apenas que não é possível alcançar o entendimento dessas situações sem que você tenha as marcas latejando no próprio corpo e alma.

Por isso que eu prefiro conversar com o vazio.


O meu mundo era muito grande e dava espaço a todos que queriam participar.
A voz das conversas era alta, o ruido sempre presente, as cores brilhantes.
Eu nunca excluí ninguém, mas também nunca prendi: eram livres para entrar ou sair.
Só que nessa bagunça eu não consguia mais me encontrar. Entre livros, móveis e poeira: onde eu estava?
Então deixei tudo encolher, esvaziar como um balão de gás que está cansado de sempre subir.
Deixei as vozes calarem. As conversas se restringirem apenas às necessárias.
As cores diminuiram, o silêncio cresceu como uma onda de calor no verão.
Aos poucos me vi envolta por fragmentos de uma era anterior, e esses fragmentos que não se dissolveram com o tempo encontraram espaço para crescer e se tornarem novas formas. Formas plenas, conscientes, sólidas.
O mundo diminuiu um bocado, é verdade. Mas todo aquele sobrepeso que eu carregava agora se foi.
Me sinto leve.


O tempo que passa
A força se esgota
A felicidade estremece
Uma gota no oceano
A sorte
A falta
De vontade
De desejo
Daquilo tudo que não faz falta
Saudade
Persistência, paciência
Ânimo ausente
Presenças ausentes
Pessoas
Vazio
Uma gota no oceano
O azar
O amor
Preencher, desistir
Impotência no pensar
Raciocínio
Mais ausências, angústias
Mais vazios, mais vida
Passado
Tremores noturnos
Sonhos perdidos
Verdades transformadas
E mentiras
Uma gota no oceano
Acaso.


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