Fico impressionada com minha própria atitude perante a chegada do dia que por tanto tempo esperei. Há três dias, reinava a exaltação dos sentidos, dos sentimentos, não cabia em mim tanta ansiedade. Era como a luz do sol que, ao nascer, devora todas as estrelas com a voracidade de uma fera incontrolável. Passou-se a noite, o dia, o ar. Não vi quando, mas tudo foi mudando, perdendo a vibração, a alegria incontestável. Uma tristeza vinda de outras eras apoderou-se de mim, tirou meu fôlego e desde então não respiro mais. Sobrevivo, dedicando-me ao nada, sofrendo com os olhares não dados e com as palavras que engasgam entre meus dedos.
You take my breath away
Por fim, hoje, não sei bem que horas, descobri que ainda estou dividida. Talvez tenha sido o acaso, o destino, o nada, alguém - enfim, mostraram-me que não estou certa do caminho a seguir. Claro, já sabia disso desde o princípio, mas me enganava com a nuvem de fumaça que ergui a minha frente. Ele veio, dissipando a magia, quebrando minhas expectativas, esfregando-me na cara o desgosto e o desconforto que sempre paira nesse limbo que há entre nós. Ele ligou, a mesma voz de sempre, os silêncios confusos, a despedida estranha -o adeus- que há sempre entre nós.
O que raios eu quero?
Sempre acho esquisita sua presença, aquele sorriso escondido entre os lábios, as palavras displicentemente jogadas com uma deliberação quase sobrenatural. Penso "ridículo". Admiro-o. Enlouqueço com as convulsões que mantém minha língua enrolada na boca; essa é a minha verdadeira droga. De repente estou alucinada com meu ódio por mim, com meu anseio de liberdade, com toda aquela coisa que não sei se é possível descrever com palavras.
Gostaria um dia de conhecer mais do que há sob aquele mistério que não consigo penetrar. Acho que é isso que admiro, na realidade. Não beleza, inteligência, o raio. É essa impenetrabilidade sob meu olhar, essa capacidade de não se deixar ver mesmo sob minha análise radioativa. Estava pensando, outro dia, "...and you don't seem the lying kind, a shame that I can read your mind". É isso, em suma. I can't. Pela primeira vez, apesar dos meus esforços. Só consigo ver a superfície, a mentira, o já conhecido, tudo o que não me interessa nem um pouco. Não consigo ir além nem um milímetro, impenetrável.
Assim como eu. Maldito.
Talvez seja um pouco de inveja, ciúme desse rival que ousa roubar meus truques, que ousa atirar em mim com minhas próprias pistolas. É duro receber no peito as próprias balas, não deixei que ele as roubasse! Mão-leve. Por que esse espelho maldito insiste em me tragar para si? Vou acabar mergulhada em minha própria essência amarga.
Isso então me joga nos braços do outro, jogando-me também nas minhas dúvidas mais profundas, nas minhas questões vitais, nas preocupações de um futuro que sequer existe. Minha paixão é tão errada. Meu desejo é só veneno para mim e não tenho antídoto. O que fazer?
Procuro por uma saída assim como procuro pela música que preciso ouvir na minha playlist. Por um momento sinto que essa faixa ainda não foi escrita, penso que serei eu a compor a próxima balada que me levará ao céu.
Ou ao inferno.
Somebody That I Used to Know
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